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NEGRONI parte 2

 

Aviso: Este conto possui descrição de cenas de violência e linguagem forte. Não é recomendado para crianças. 

Conto: Negroni parte 2
Autor: Soaréstes Santos

Havia dezesseis pessoas na sala, incluindo Andréia e Alexandre. Sete representantes dos clãs sentados e seus seguranças logo atrás, todos vampiros. O médico se posicionou atrás da cadeira onde Andréia se sentou.

Todos já provavam suas bebidas, mas aguardaram Andréia chegar para degustarem o charuto escolhido. Um garçom serviu a todos, os que estavam sentados e os que estavam de pé. Um umidor feito de ossos de camelo guardava as preciosidades do Black Dragon. Os primeiros momentos da reunião foram descontraídos, todos falavam amenidades. Andréia foi quem introduziu o assunto delicado.

- Senhores. Todos sabem o porquê estamos aqui. Fui atacada e, não fosse pelo meu amigo, estaria morta. Quem tem informações sobre caçadores agindo aqui?

- Minha cara. Ficamos surpresos em saber que fora atacada. – disse um velho, com um olhar arrogante.

- Não sabíamos que uma figura tão importante estava em nosso país.

- Se vocês não sabiam que eu estaria aqui são mais incompete0ntes do que eu imaginava.

- Incompetentes? Mais respeito. Aqui estão os representantes de todos os clãs. – esbravejou um jovem.

- Se vocês são os mais hábeis que sobreviveram, nossa espécie está fadada a extinção.

O jovem se movimentou em protesto ao tratamento recebido, mas antes de se pôr em pé, Andréia estava tête-à-tête com ele. Sua velocidade assustou a todos. Ninguém conseguiu enxergar os movimentos da vampira. Seus poderes eram assombrosos.

- Se você piscar sem eu mandar, morre. – sussurrou Andréia no ouvido do jovem vampiro.

- Acho que vocês ainda não entenderam a gravidade da situação. Ninguém sabe de um grupo de caçadores atuando por aqui?

- Há rumores, mas ninguém desaparecido. – respondeu um dos homens.

- Não acredito que o ataque era direcionado a você. Foi um golpe de sorte deles. – disse uma mulher.

- E por que acha isso?

- Como nosso amigo disse, há rumores de que um grupo de caçadores está plantando uma base aqui em São Paulo. Mas não há nenhum incidente. – respondeu.

- Pois bem. Fiquem atentos! Quero saber de tudo o que acontece por aqui. Vamos matar estes desgraçados.

Ninguém ousou mais desafiá-la, no início pensavam que Andréia fosse uma vampira estrangeira qualquer. Porém, a velocidade que ela demonstrou apenas um vampiro muito antigo e poderoso poderia ter alcançado. Eles buscariam na história para descobrir qual era o seu nome verdadeiro. Não houve mais diálogos, após encerrarem os charutos, todos partiram, exceto Andréia e Alexandre.

- Preciso de uma bebida. – disse Andréia.

- Acho que eles não fazem Bloddy Negroni.

- Pode ser um Negroni comum.

Alexandre acionou a campainha e um garçom veio atendê-lo. Minutos depois, dois drinks foram entregues na sala. Os dois apreciaram a bebida e voltaram para o apartamento. Em dois dias eles se reencontrariam.

Alves, Carvalho, Ferreira, Oliveira, Pereira, Santos e Silva foram as casas que compareceram. Até onde se sabe, são as sete casas brasileiras de vampiros. Todos muito novos, se comparada as criaturas de outras terras. O mais velho, Ferreira, foi transformado no final do período do Brasil colônia, pouco antes da proclamação da independência, quando já tinha idade avançada. O velho pertencia a primeira geração brasileira de sua família. Sua atitude saudosista e fiel a Don João o isolou da corte imperial brasileira. Ele aceitou o seu fado na tentativa de reconquistar a importância e influência, mas sem sucesso. Com esforço, conseguiu manter suas terras, o que lhe garante bons dividendos até hoje. A casa mais nova era a Silva, a primeira casa de vampiros negros, tem sua origem com um abolicionista que, no dia em que a princesa Isabel assinou a lei áurea, foi espancado e deixado para morrer em uma das margens do rio Anhangabaú. Para salvar a sua vida e se vingar dos agressores, ele aceitou a maldição. A casa Santos descendia do cacique Tibiriçá e ainda mantém contato com sua origem indígena. As demais casas, eram descendentes de trabalhadores das fazendas de café, cana-de-açúcar e cacau.

Ninguém sabe ao certo quem foi o vampiro a transformar todos eles, mas em conversas sobre suas origens, os patriarcas de cada família chegam a um nome em comum, conhecido como Dom Bragança. Sua última aparição foi no início do Brasil republicano, quando ele marcou uma reunião com todos os sete transformados e os apresentou. No encontro, disse que eles eram o futuro da raça no solo sul-americano e que deveriam se unir. Depois disto, nunca mais foi visto. O seu desaparecimento foi fonte de discórdia e separação entre as casas, mas como responsável pela criação dos vampiros foi o elo que manteve a paz e impediu que as famílias brigassem entre si.

O Ferreira e o Carvalho estavam hospedados no mesmo hotel, próximo a avenida Paulista. Apesar da advertência de Andréia para tivessem cuidado, os dois descansaram, tomaram banho e partiram para aproveitar a noite de São Paulo. Os dois seguiram para a Vila Olímpia, onde havia uma casa especializada em fornecer mulheres e homens para satisfazer os desejos de seus frequentadores. Abusos eram permitidos, desde que combinados com antecedência. A morte, inclusive, era um pedido frequente na lista dos clientes. Tudo tinha um preço, a vida de uma jovem bonita era a mais cara, pois é um dos ativos mais rentáveis, mas havia quem pagasse por isso. A casa tinha três entradas. A primeira porta era como a de todas as casas noturnas com segurança e que que dava acesso ao salão principal. Qualquer frequentador comum podia aproveitar a noite comprando bebidas e amigos. A segunda porta envolvia um túnel subterrâneo com acesso do hotel vizinho à casa. Clientes especiais entravam pelo saguão do hotel e transitavam para a casa noturna. Só tinham acesso a esta passagem um grupo restrito clientes e, para entrar neste grupo, somente por indicação de algum membro. Além da confidencialidade reforçada pelos laços de amizade dos membros, qualquer infração às regras da casa era de responsabilidade solidária, ou seja, o infrator e a pessoa que o indicou sofriam as mesmas penalidades. A terceira e mais exclusiva de todas as entradas era através do restaurante de luxo que ficava do outro lado da rua. O restaurante atendia celebridades, autoridades e empresários. Para desfrutar da hospitalidade e sigilo, era necessário que o cliente fazer a reserva. Depois, o gerente da casa enviava uma localização onde o cliente seria retirado. Ao finalizar o atendimento, o cliente receberia outra localização informando onde seria deixado. Apenas os veículos do restaurante tinham trânsito permitidos. Além disso, o veículo era usado uma única vez, ou na realidade, a placa era trocada em toda viagem. Desta forma, o acesso ao restaurante é realizado apenas através de um carro oficial, não havia qualquer maneira de entrar no salão e pedir uma mesa. O próprio salão era pequeno, câmeras e celulares proibidos, assim, os poucos clientes que queriam ficar no salão aberto, não corriam o risco de serem incomodados. O restante era servido em salas íntimas. Apenas um subgrupo nesta classe elitista conhecia os serviços oferecidos pela casa noturna e a passagem secreta que levava até ela. Homens e mulheres muitos ricos e poderosos, com desejos bem peculiares, e de caráter duvidosos contratavam os serviços, além das criaturas.

O Ferreira e o Carvalho gozavam deste último privilégio. Por medidas de segurança, o restaurante enviou dois carros, já que os vampiros fizeram reservas separadas. Um carro levou Carvalho e seu segurança e outro carro carregava Ferreira e seu segurança. Durante o trajeto ambos informaram ao motorista que desfrutariam do serviço juntos. Os funcionários informaram a casa sobre o pedido e o salão foi ajustado para servir os dois. Os dois jantariam e, depois, iriam para a casa noturna na sua área mais exclusiva. Esta área, no entanto, tinha uma particularidade. O acesso a ela era idêntico ao acesso da entrada principal. Os participantes que seriam utilizados eram filmados pela câmera de segurança como se estivessem deixando a casa. Desta forma, caso fossem procurados, a casa apresentava estas imagens, já que muitos não saíam com vida das festas. Isto aconteceu duas vezes em mais de dez anos de atividade. Duas jovens que desapareceram tinham o seu último paradeiro a casa noturna. A polícia requisitou as imagens da câmera de segurança e viu as duas deixando o local vivas e afastando qualquer suspeita do estabelecimento. Os vampiros chegaram ao restaurante.

- Hoje eu estou com fome! – disse Carvalho.

- Não vá se empanturrar. Pode ter uma congestão durante nossa diversão após o jantar.

O garçom já aguardava no salão preparado para os dois.

- Boa noite, senhores. Sejam bem-vindos ao restaurante. Já sabem o que pedirão?

- Sim, o de sempre. – responderam os dois.

- Perfeito. – o garçom digitou no tablet o pedido. – Apenas confirmando. Dois negronis de aperitivo, duas saladas de peito de entrada, um entrecôte ao ponto e um stinco defumado, os dois pratos principais sem acompanhamentos, uma garrafa de vinho tinto e sem sobremesa.

- O serviço aqui é sempre sensacional! – disse Ferreira.

O garçom agradeceu o elogio com um sorriso.

- Corretíssimo, meu caro! Acelera que eu já estou com água na boca. – completou Carvalho.

Precisamente, um minuto depois, o garçom trouxe os drinks. A bebida abriu mais o apetite dos dois. Em seguida, uma salada de folhas verdes, palmito, alcachofras sobre uma cama de carpaccio de peito.

- Este carpaccio é delicioso. – disse Carvalho.

- A textura é perfeita. O sabor desta gordura é divino. – elogiou Ferreira.

O carpaccio de peito pode soar estranho, não se faz carpaccio com este corte de carne. Porém, o restaurante também tem suas excentricidades. A carne em questão é de humanos, ou melhor, carne de peito de mulher! Neste ecossistema empresarial diabólico, tudo é aproveitado, inclusive os corpos dos indivíduos mortos pelos clientes. A carne deliciosa que era elogiada tinha garantia de origem, as vítimas da casa noturna. Além disso, o corte especial de humanos também era revendido para outros restaurantes no país.

Os dois pratos principais foram servidos com precisão no tempo e preparos perfeitos. Tanto o entrecôte quanto o stinco também eram de humanos. Apenas os clientes especiais sabiam da procedência da carne deliciosa, os demais saboreavam sem saber que estavam praticando canibalismo.

O jantar terminou e ambos dispensaram seus seguranças. A luxúria e o sangue faziam parte dos cardápios apenas dos dois líderes. Os carros levaram os seguranças para o ponto de entrega combinado, de lá eles partiriam para o hotel. Porém, eles foram deixados próximo a hospedaria, por isso, decidiram ir caminhando. Descansariam, já que os seus senhores deram ordens de que não precisariam de auxílio e não tinham hora para voltar.

Enquanto caminhavam pela Rua Augusta, tiveram suas atenções chamadas por uma garota que estava na porta de um inferninho, como são conhecidos bares de fama duvidosa em São Paulo. A moça tinha uma beleza exótica e fora do padrão, mas esta não foi a razão principal pela qual os seguranças foram atraídos. Uma boa dose de feromônios foi espalhada pelo corpo da jovem e um aroma docemente ferroso saía pelo corredor escuro que dava acesso ao bar.

- Boa noite, rapazes! Procurando por uma diversão que alegre o coração de vocês?

- Não estávamos procurando, mas, pelo jeito, fomos encontrados por ela.

- Basta seguir pelo corredor.

- Você não vem?

- Não. Quem ficaria em meu lugar? Estou aqui para chamar a atenção.

- Uma pena.

- Podem ter certeza de que serão surpreendidos com o que encontrarão lá dentro.

Os dois entraram pelo corredor escuro. Uma lâmpada vermelha brilhava ao fundo, indicando a entrada do local. Um homem uniformizado recebia os clientes.

- Boa noite, senhores. Sejam bem-vindos.

Eles entraram pela porta e viram um salão pequeno, pouco iluminado e com um cheiro forte de tabaco e sangue. Mesas quadradas e baixas eram rodeadas por sofás e poltronas. O local deveria comportar setenta pessoas, mas havia menos de vinte, incluindo as moças que trabalhavam na casa. Eles caminharam até o bar e pediram suas bebidas. O bartender entregou os chopes em canecas grandes e congeladas e uma porção de castanhas de caju.

- Que tipo de diversão os cavalheiros desejam?

- Uma mulata. – respondeu um.

- Uma asiática. – replicou o outro.

O bartender informou a escolha dos dois por um rádio. Instantes depois, uma portinhola se abriu e duas mulheres saíram, vestindo poucas roupas. Elas se aproximaram e, pegando a bebida deles, os convidaram para segui-las até o quarto onde seriam atendidos. Sem que percebessem, as moças pingaram nitrato de prata em suas bebidas. Mais um corredor escuro e, logo depois, uma sala com duas poltronas reclináveis. Eles se acomodaram e assistiam a dança das moças. Assim que beberam seus chopes, os dois apresentaram sintomas alérgicos. Tosse, vermelhidão e inchaço. As moças deram um sinal e dois homens surgiram por trás das cortinas que faziam a decoração da sala. Cada um portava uma seringa e injetaram poderosos calmantes nos vampiros. O nitrato de prata serviria para identificar as criaturas, pois grande parte delas têm reações alérgicas a prata. Uma solução boa e barata para separar os boêmios dos monstros. Uma gota passaria despercebida pelo paladar que qualquer humano, mas cria uma reação imediata nas criaturas.

Os vampiros acordaram, ainda tontos pela droga e perceberam que estavam amarrados, cada um em uma maca. As duas moças os observavam de longe.

- Onde estamos? – gritou um eles.

- Em nossa sala de coleta de informações. – respondeu a morena.

- Como assim? O que isto significa?

- É exatamente o que diz. É a sala onde coletamos as informações que precisamos.

- Vocês não sabem com quem estão lidando.

- Sabemos sim! – disse a outra mulher.

Ela trazia um objeto na mão. Assim que aproximou do vampiro, ela ergueu o braço e mostrou o item para ser analisado.

- Uma lanterna? O que vai fazer com uma lanterna? – esbravejou o outro.

- Hum! Direto ao ponto. Gosto assim.

A mulher acendeu a lâmpada e mirou no peito do vampiro. A luz ultravioleta passou a fritar a a sua pele.

- Onde fica o ninho de vocês?

- Não daremos informação nenhuma.

- Onde fica o ninho?

A morena arrastou uma mesa e, sobre ela, uma bandeja com instrumentos assustadores. A sessão de tortura começou. O bar fora instalado em um local estratégico pelo grupo de caçadores. Aquele era o dia da inauguração do empreendimento. Tudo fora pensado com calma e aplicado de forma precisa. A caçadora que ficava de isca na entrada estava banhada em hormônios que excitavam a qualquer um. O aroma de sangue seria facilmente percebido por qualquer criatura. Para infelicidade dos dois seguranças, eles foram os primeiros capturados pelo grupo. O inferninho era a armadilha para atrair e prender demônios como aqueles dois. Este era o grupo de caçadores do qual os vampiros comentaram em sua reunião.

Enquanto as duas caçadoras tentavam arrancar quaisquer informações dos dois vampiros, foram interrompidas por um homem que entrou na sala.

- Podem parar. Já sabemos quem são os dois.

Imediatamente, cada uma espetou uma estaca nos corações das criaturas e deceparam suas cabeças.

- De onde veio a informação? – perguntou uma delas.

- Do nosso novo recruta.

Elas abandonaram a sala e deixaram os corpos para a equipe de limpeza.

Na boate, Ferreira e Carvalho terminavam suas orgias e se deliciavam no sangue de suas presas. Ferreira havia pedido as duas moças mais jovens que havia disponível, já Carvalho, pediu por dois rapazes de, no máximo, vinte anos. A última vítima era a que mais sentia o terror psicológico causado pelas criaturas, pois uma vez mordido, o vampiro sugava rapidamente o sangue e a primeira vítima perdia a consciência. Quem ficava por último tinha o desprazer de ver a transfiguração das criaturas e o assassinato de seus companheiros diante de seus olhos. Depois de muito sangue e mais bebidas, os vampiros solicitaram o transporte e pediram para serem deixados no hotel. O gerente da casa atendeu sem protestos, afinal, o cliente tem sempre razão. Durante o trajeto os dois discutiam sobre a reunião, sobre os caçadores e quem era Andréia. Acharam prudente seguir, pelo menos, inicialmente, os pedidos da vampira. Eles chegaram ao hotel e tomaram o elevador. Estavam hospedados no mesmo andar, o último, nas duas suítes executivas do hotel. Eles se despediram e combinaram o horário do café da tarde no outro dia. Dormiriam o dia inteiro e se protegeriam da luz do sol.

Ferreira entrou no quarto e sentiu um perfume diferente. Ficou surpreso com a figura que estava sentada na poltrona. Apesar do espanto, ele agiu com naturalidade.

- Boa noite, senhorita. Acredito que você esteja no quarto errado.

A morena continuava em silêncio. Ferreira retirou o paletó e o pendurou no armário.

- Qual o seu nome?

- Vanessa.

- O que faz aqui em meu quarto, Vanessa?

- Eu vim para te fazer companhia.

- Entendo. Não me recordo de solicitar algo assim para ninguém.

- Eu sou um presente enviado por um amigo.

- Interessante. Não tenho amigos na cidade.

- Correto. Desculpe a confusão. Eu sou um presente de uma amiga sua.

- Quem?

- Andréia.

- Entendo. Agradeço o presente incrível. Porém, pode falar para a sua chefe que eu não preciso deste tipo de bajulação.

Os hormônios em excesso e o plasma de sangue que ainda perfumavam o seu corpo enlouqueceram o vampiro. Ferreira fechou os olhos e apreciou a fragrância da bela mulher.

- Seria um pecado recusar um presente como este.

O velho vampiro se aproximou.

- O que é isso em suas mãos? Faz parte do presente?

- Sim.

Vanessa esticou o braço e acionou a poderosa lanterna. A pele do velho ardia e o cheiro da carne queimada se misturava aos aromas do quarto. O velho, porém, continuou a caminhar em direção a caçadora. O sangue das jovens que consumira pouco antes o deu um novo virgor. As feridas em seu corpo cicatrizavam rapidamente. Vanessa sentiu que haveria um embate corpo a corpo. Ela puxou uma adaga de prata e aguardou.

- Você pode se machucar com isto. Não é coisa para uma criança brincar. – ironizou o vampiro.

Ele partiu para o ataque e os dois se atracaram. A força do velho era sobrenatural e Vanessa foi facilmente dominada. Ele agarrou o seu pescoço, a levantou e a arremessou contra a parede.

- Agora, Vanessa. Você me contará quem é de verdade! – disse o velho agarrando novamente a moça.

Ela tentou falar, mas não conseguiu. A pressão das garras do velho apertava seu pescoço e a fazia sufocar. Seu corpo se debatia em espasmos, de repente, parou.

- Você não vai morrer tão facilmente.

O velho deitou o corpo da moça na cama e massageou o seu peito. Em seguida, soprava ar para dentro dos pulmões dela. Na terceira série de massagem a moça inspirou fundo e se sentou. Sua boca sussurrava palavras e seus olhos estavam fixos na parede, pareciam não enxergar o vampiro.

- Quem é você?

Os lábios se mexiam sem emitir som algum. O velho aproximou o ouvido para tentar discernir as palavras da jovem. De repente, sentiu uma picada em seu peito. Vanessa cravara uma seringa com calmantes no coração do velho. O braço do vampiro se esticou e arremessou a moça longe. Porém, já não havia mais tempo. A droga fazia efeito em seu corpo, sua última visão foi de Vanessa se levantando do outro nado do quarto e desmaiou.

Minutos depois, a campainha do quarto tocou. Cláudia, a caçadora asiática, trajava um uniforme do hotel e puxava um carrinho com roupas de cama sujas. Ela gesticulou para a amiga e Vanessa carregou o corpo de Ferreira. O corpo de Carvalho já estava sob os lençóis. Elas desceram até o subsolo onde uma van aguardava para levar os vampiros até um local onde pudessem ser interrogados.

Andréia ficou muito tensa até o segundo encontro. Alexandre passava o dia inteiro com ela e a noite, continuava sua jornada no hospital. O suprimento de sangue estava garantido com o esquema que montou. Além do mais, ele subornou um empregado do necrotério para o manter informado se o corpo do caçador fosse reclamado por alguém. Ele já não dormia mais e não se sentia cansado. Os dias com Andréia eram cheios de paixão e as noites eram tumultuadas, pois ele precisava ajustar todo o plano para que ninguém descobrisse o desvio de sangue.

A noite do encontro chegou, mas desta vez eles foram os primeiros a entrar no lounge. Os minutos se passaram e apenas quatro representantes apareceram, desta vez com mais seguranças.

- Em nossa primeira reunião havia sete clãs representados. Hoje são apenas quatro. Alguém pode me dizer o que aconteceu?

- Há rumores estranhos. Oliveira me disse que não vem pois está com medo. Já os outros dois, estão desaparecidos. – disse a mulher que estivera na primeira reunião.

- O que? – perguntou Andréia.

Os outros líderes demonstraram espanto com a revelação.

- Isso mesmo. Estamos sendo caçados! – disse a mulher.

- Podemos estar sendo observados agora. A casa está comprometida. Fiquem nas sombras por enquanto. Eu chamo vocês quando tiver mais informações. Vou precisar chamar por ajuda. – completou Andréia.

Imediatamente, todos se retiraram.

- Acha mesmo que estamos em perigo aqui? – perguntou Alexandre.

- Não tenho certeza. Porém, agora há desaparecidos. Precisarmos ficar alertas!

De volta ao apartamento, Alexandre preparou dois Bloody Negroni e eles beberam e conversaram até alta madrugada.

- Hoje eu fico no quarto de hóspedes, meu querido.

- Sem problemas.

Andréia tomou um banho e se deitou. Não percebeu o momento em que pegou no sono. Horas depois ela acordou aos gritos com o sol queimando o seu rosto. No instante em que atacaria, percebeu que estava imobilizada. Um homem fechou a fresta na janela e o faixo de luz que queimava o seu rosto se apagou.

- Eu vou te matar, seu desgraçado. Quem é você? O que quer?

Não houve resposta.

- Onde está o Alexandre?

- Ele está bem.

- Alexandre! – gritou.

Instantes depois, o médico entrava pela porta do quarto.

- Você tem ideia do mal que me fez? Seu demônio maldito!

- O que?

- Você não percebeu?

- Perceber o que? O que está acontecendo, Alexandre?

- Acho importante você saber a verdade antes de morrer. Eu tinha sido recrutado por um grupo de caçadores. Eles sabiam que havia criaturas na cidade há tempos, mas não conseguiam pista alguma. Demorou bastante até eu acreditar na história toda de vampiros e outras criaturas. Na verdade, eu só tive certeza quando você me transformou em um. Eu estava a caminho do trabalho quando recebi a ligação de um caçador dizendo que matara uma vampira e que me enviaria o corpo para eu analisar. Ele sabia que somente com uma prova cabal eu acreditaria neles. Porém, enquanto ainda falava comigo, a ligação caiu.

- Era você na ligação?

- Sim. Tenho de admitir, foi muita coincidência eu ter te encontrado aquele dia no bar. No dia seguinte, quando fiquei doente, achei que você tinha me drogado, mas meu quadro piorou e aquela infecção tomou conta do meu corpo. Eu pensei que morreria. Uma das coisas que me intrigava era que eu não fazia ideia de qual organismo poderia causar todos aqueles sintomas. Pensava em você e me perguntava se você os estaria sentindo. Que doença agressiva! Imagina o estado da minha mente! Eu havia sido largado pela minha esposa, minha desgraça era tamanha que eu aceitei conversar com pessoas que se denominavam caçadores de vampiro. Pensei que tinha me dado bem naquela noite com uma mulher bonita. No outro dia, descobri que ela tinha me passado uma doença mortal.

- Eu vou te matar!

- Acho que não. Agora, você me deixou em uma situação muito complicada. Eu encontrei um propósito digno na minha vida, o de matar criaturas como você, mas você me transformou em uma delas. Me amaldiçoou sem eu saber. Eu me tornei aquilo que eu estava destinado a matar. Irônico não?

- Aonde você quer chegar com isso?

- Graças à Deus por você ter me encontrado. Ele existe, certo?

- Não me interessa.

- Está chegando a hora de partir. Não se preocupe, eu farei com que não sinta dor. Eu combinei com a equipe e eles me aceitaram. Pelo menos até que reste apenas um vampiro, neste caso, eu mesmo. Depois, eles poderão me matar.

- Eu gostei de você, Alexandre.

- Eu duvido. Se você tivesse gostado de mim, não teria me amaldiçoado. Você não sabe o quanto me custou ter você aqui todos estes dias. Eu me sinto mais sujo por ter passado esse tempo com você do que matando aqueles vampiros escrotos que conhecemos. Você não gosta de ninguém a não ser de si.

Alexandre aplicou uma injeção no braço de Andréia e ela apagou. O outro homem que estava no quarto hesitou na hora de cravar com uma estaca no coração da vampira.

- Melhor a mantermos com vida por enquanto. Ela pode nos dar muita informação!

- Não sei se concordo com as torturas.

- Você tem ideia do quão antiga é esta criatura? Imagina o quanto podemos avançar na luta contra estes monstros?

- Você está certo. Porém, eu vou conduzir os interrogatórios. Há drogas mais eficientes do que a tortura para arrancar informações de uma pessoa.

- Ela não é uma pessoa. Porém, concordo contigo. Vou chamar um carro para transportá-la para a nossa sede.

O médico não sabia bem o efeito que as drogas teriam no corpo de um vampiro, havia muitas perguntas que ele precisava responder. Além do mais, seria mais difícil contatar os demais clãs. Sua jornada como caçador começara capturando dois líderes de clãs e uma das vampiras mais velhas e poderosas que existia. Um novo caminho se abria para ele. O médico estava disposto a buscar redenção por ter negligenciado todos ao seu redor. Aquele caminho o levou a solidão, mas também a este novo propósito. Um novo universo e infinitamente maior do que sua mente de cientista conhecia se apresentava. Ele se perguntava o que o futuro o traria. Quais criaturas existem? Quais são as outras dimensões que Andréia falou? Seu coração se agitava e, ao mesmo tempo, se conturbava. Ele precisaria reestabelecer os laços com a família e amigos, mas como faria isso sem colocá-los em risco? Ou como fazer isso sendo um vampiro? Este foi o primeiro encontro dele com o sobrenatural aos olhos humanos.

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